segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
O nome
Velho, muito velho, o homem ia toda noite ao bar e tinha um só assunto: um amor antigo, que havia se perdido no tempo mas não na sua memória. Falava da mulher, da sua beleza, dos olhos, dos cabelos de ouro, e começava então a chorar. Não conseguia lembrar-se do nome dela e mortificava-se por isso. Os fregueses do bar ouviam-lhe pacientemente a história e sugeriam-lhe luanas, irenes, cecílias, iaras, normas. Ele ficava esperançosamente atento, mas nenhum era jamais o nome da amada. Uma noite, depois de mais algumas dezenas de nomes propostos, pôs-se a chorar mais forte do que nunca. Os fregueses sorriram. Um dos nomes ditos devia ser enfim o que ele vinha procurando durante tantos anos. Ele disse que não, pediu sua conta, declarou a amarga certeza de que nunca o nome lhe viria, despediu-se e foi embora. Na noite seguinte, não apareceu. Um neto o havia encontrado morto naquela manhã, com a lista telefônica aberta ao meio. Um círculo grande cercava um nome, mas, como outras páginas também estavam sublinhadas e rabiscadas pela ansiosa caneta do velho, o neto não deu importância àquilo.
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