sábado, 17 de agosto de 2013

Um soneto de Herberto Helder

"Às vezes, sobre um soneto voraz e abrupto, passa

uma rapariga lenta que não sabe,
e cuja graça se abaixa e movimenta na obscura
pintura de um paraíso mortal.
Nesse soneto noturno escrevo que grito, ou então que durmo,
ou que às vezes enlouqueço. E a matéria grave
e delicada do seu corpo pousa no centro
desse sopro feroz. E o soneto
veloz abranda um pouco, e ela curva o corpo
teatral - e o ânus sobe como uma flor animal.
O meu pênis avança, no soneto que soletro
como uma dança, ou um peixe negro nos
frios planos sombrios e sonâmbulos:

- a aliança intrínseca de um pênis e de um ânus."

(Do livro Ou o poema contínuo, publicado pela Girafa.)

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