domingo, 9 de janeiro de 2011
O rosto
Negaram-lhe uma vez, quando menino, um doce ou um ingresso de cinema. Ele não se lembra mais do que era, mas lembra-se de lhe terem dito que aquilo era feito para o seu bem, para discipliná-lo. O mesmo lhe disseram ontem, quando lhe negaram algo mais precioso que o doce, o ingresso de cinema e sua própria infância. Até ontem ele acreditou no motivo que apresentaram quando lhe recusaram o doce ou o ingresso. Hoje não acredita mais. Sabe que ontem, como no passado, foi por maldade, aquela maldade que é a pior forma de domínio a que um ser humano pode ser submetido por outro. Não se lembra mais do rosto de quem o magoou quando menino. Mas imagina que seja como o rosto de quem o magoou ontem. A maldade, para ser plena, há de assumir sempre um rosto do qual não se receie nada parecido com a perversidade. Um rosto belo, um rosto claro e insuspeito como o de uma mãe ou o de uma amante.
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