sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Naquela tarde

Te esperei naquela tarde
como um crente espera o milagre
e o mendigo espera o pão

O sol se exauria
em majestade
e jovens casais
de mãos dadas
gorjeavam como se
a qualquer momento
pudessem voar
se os incitasse a vontade

Eu não tinha esperança nenhuma
diga-se logo
mas confiava em certa loucura
aquela que mistura
destino e fatalidade
uma loucura que só
os devastados
pelo amor conhecem
e que nenhuma esperança
jamais suplantará

Eu não tinha por que esperar
mas esperei
e continuei esperando
mesmo depois
que uma chuva fria e cruel
urinou sobre mim
toda sua zombaria

Fiquei te esperando
porque esperar
mesmo sem esperança
é a sina e a virtude
de todos os enamorados

Se tivesses aparecido
a tarde naturalmente
se reabriria inteira ao sol
e os jovens casais
talvez voassem enfim

Mas se tivesses aparecido
eu não te sentiria
tão presente
como te senti
pungentemente
no instante em que
já noite
juntei minhas lágrimas à chuva
e olhando ainda
para todos os lados
(devia ter olhado também
para o alto, minha estrela)
me pus a ziguezaguear
como um cão sem dono
sem faro sem norte

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